22 de agosto de 2013

Recordar é Matar Saudades *

                                                                  Anita do Lagar



Ana de Jesus Motta (Anita do Lagar) com duas filhas e uma neta, à porta de casa.
                                                 

As minhas irmãs mais velhas, quando da inauguração do Grémio em 1933 eram jovens. Entre primos e não primos seriam talvez uns quinze rapazes e doze ou treze raparigas na época. Os mais velhos à volta dos 25 anos e os mais novos com 14 ou 15 anos. A grande loucura eram os bailaricos. De vez em quando juntavam-se e lá iam dançar.
Acontece que num belo e célebre dia de Ano Novo ou de Reis, era dia Santo, talvez em 1937 ou 1938, sei que fui testemunha, as cinco filhas da minha mãe, a mais velha com 17 ou 18 anos e eu com 5 ou 6 anos, fomos ao princípio da tarde à capela de S.ta Margarida participar num ritual religioso – Beijar o Menino Jesus.
Acabou a devoção e lá viemos ladeira abaixo a caminho de casa. Morávamos na casa da empresa, em frente ao açude. Quando atravessou a ponte sobre a ribeira, o rancho Teixeira parou em frente à casa dos primos Tomaz e à casa da tia Florência que tinha uma filha jovem mas um pouco oprimida pela família.
Essa prima estava à janela e deu-nos conhecimento que havia ajuntamento no Grémio. Ora as minhas irmãs, calculando que os namorados deviam lá estar, não resistiram e levam com elas as irmãs mais novas.
A minha mãe, a “Anita do Lagar”, tinha relógio em casa, era tarde de Inverno, entendeu que já era tempo de as filhas chegarem a casa. Nem pensou nos prós nem nos contras. Vem estrada fora. A primeira pessoa que encontrou foi a tal menina que estava à janela. Logo pediu informações:
- Viste as minhas filhas?
- Oh prima, as suas filhas foram todas para o Grémio! – respondeu maldosa.
Aí vai a prima Anita do Lagar de vara na mão. Entra a porta da sala do Grémio precisamente quando a música da grafonola começa a tocar e os pares de namorados davam os primeiros passos de dança.
Por motivos de força maior parou a música, parou o baile e lá vêm escada abaixo (1.º andar bem alto) as cinco Teixeiras à frente da mãe. Parece-me que a vara não funcionou mas a façanha nunca foi esquecida.
O meu pai é que não gostou nada da ação da sua esposa.
A minha mãe tinha pavor a bailaricos e namorados das filhas à porta. Todos os que por lá passaram ficaram com poucas recordações agradáveis. Esta estória do baile passou-se já lá vão 75 anos.(Dulcinda Mota Teixeira)**

* Expressão utilizada por Dulcinda Teixeira num texto que havemos de ler um dia destes.
** D.M.T escreve de acordo com  o novo AO (de facto não há bela sem senão).