Si hortum in biblioteca habes deerit nihil

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Todos os textos aqui publicados podem ser utilizados desde que se mencione a sua origem.

29 de março de 2016

Ilídio Mota Teixeira (1930-2016)


Eu tenho a fantasia de imaginar os homens como as árvores e por isso acreditar que a inteireza e a verticalidade dependem da estrutura do tronco, sim, mas que este, por si, rebenta com a ajuda do carácter das raízes. Tenho assim a tendência para arrumar as gentes (ia a dizer classificar mas pode confundir-se com ordenar e não é essa a minha intenção) de acordo com a importância que dá às origens. Há quem não lhes ligue nenhuma, quem viva tão ávido de “folhas, flores e frutos” que nem chega a ter raízes superficiais, está tão ao sabor do vento que corre o risco não de viver desenraizado mas desenterrado. Também existe o oposto, quem só viva à custa e pelas raízes, mas esses são grandes tubérculos, batatonas imensas cheias de vaidade, condenadas a vaguear sem a claridade que presenteia as árvores desta vida. E há outros, que vivem fazendo gosto em carregar consigo o berço, seja ele de que matéria for tecido, e transmiti-lo, à família e até a outros, sem que nada a isso os obrigue, só porque sim, porque são árvores altas e frondosas e a sua sombra todos acolhe. É o caso de Ilídio. Ele teve a generosidade de partilhar o que a sua memória trouxe de menino mais o que outros antes dele lhe contaram, e que a sua sensibilidade e inteligência souberam reproduzir. Tive a sorte de beneficiar dessa nobreza de alma.  A minha eterna gratidão. Graças a ele conheci alguma história e reflexões sobre a história de Porto da Lage, aquilo a que chamou lembranças e conjecturas a "pequena história" desta localidade na primeira metade do sec. XX, os seus tipos   trágicos e cómicos que mais do que uma geração conheceu, os dramas  locais e os  grandes acontecimentos, os pontos de encontro diversão, com o grémio à cabeça, e a grande marca da terra, a família,  as características especiais  dos tios , de primos e de primas. De tudo nos falou Ilídio Mota Teixeira, nos posts publicados com a colaboração de sua filha  no ano de 2013, com graça, talento e um  amor visível pela terra que o viu nascer. Guarda desta forma, este blog, as marcas de alguém que passou por nós cumprindo a missão de perseverar e transmitir heranças. Saibamos nós honrar a sua confiança legando-as a outros. (MFM)



Ilídio Mota Teixeira com a idade de 22 anos na colina da Ermida de Sta. Margarida

Ilídio Mota Teixeira nasceu em Porto da Lage em 8 de Novembro de 1930, sexto e penúltimo filho do casal  Luís Pereira Teixeira e Ana Rosa Mota. A irmã Doce recorda-o como uma criança alegre, grande caçador de grilos que trazia para casa em quantidades apreciáveis, dentro do boné. Era também um cavaleiro apaixonado, tendo chegado a ir até Ferreira do Zêzere montado numa égua propriedade da sua casa. Depois da  primária em Porto da Lage, na escola sua vizinha de rua, fez o Liceu na cidade do Porto, localidade onde exerceu toda a sua actividade profissional na empresa familiar da qual era sócio, onde viveu o resto da sua vida, tendo-se apenas afastado para cumprir o serviço militar em Tavira e Tomar. Faleceu, igualmente no Porto, no passado dia 23 de Março.Deixa duas filhas e uma neta.

Nota: Fotografia e dados biográficos fornecidos pela irmã, Dulcinda Mota Teixeira.

23 de março de 2016

Volta de Novo à Terra



Pablo Picasso -1930



A Jesus Crucificado


Volta de novo à Terra,
Alvo e manso Cordeiro,
Vem resgatar os homens
De pecados sem fim.

O preço do resgate
Só o teu corpo e o teu sangue
O poderão pagar.

Nesta hora de fé,
Eu te prometo e juro
Que hás-de tornar a ser
Por nós crucificado.

Ao cimo do Calvário,
Maria nossa Mãe,
A açucena da Terra
E o arco-íris do Céu,
Há-de estar a teu lado.

E o azul do seu manto,
Ao pé de ti, será
O luar reflectido
Sobre o esplendor do Sol.

Américo Durão (1893 -1969)

20 de março de 2016

Primavera





Primavera ,Veloso Salgado (1864-1945)


Provincianas

Olá! Bons dias! Em Março,
Que mocetona e que jovem
A terra! Que amor esparso
Corre os trigos, que se movem
Às vagas dum verde garço!

Como amanhece! Que meigas
As horas antes de almoço!
Fartam-se as vacas nas veigas
E um pasto orvalhado e moço
Produz as novas manteigas.

Toda a paisagem se doura;
Tímida ainda, que fresca!
Bela mulher, sim senhora,
Nesta manhã pitoresca,
Primaveril, criadora!

Bom sol! As sebes de encosto
Dão madressilvas cheirosas
Que entontecem como um mosto.
Floridas, às espinhosas
Subiu-lhes o sangue ao rosto.

Cresce o relevo dos montes,
Como seios ofegantes;
Murmuram como umas fontes
Os rios que dias antes
Bramiam galgando pontes.

E os campos, milhas e milhas,
Com povos de espaço a espaço,
Fazem-se às mil maravilhas;
Dir-se-ia o mar de sargaço
Glauco, ondulante, com ilhas!

Pois bem. O Inverno deixou-nos.
É certo. E os grãos e as sementes
Que ficam doutros Outonos
Acordam hoje frementes
Depois duns poucos de sonos.

....................................


Cesário Verde





18 de março de 2016

Excursionistas de Passagem por Paialvo

Em 2 de Abril de 1897 o Periódico Branco e Negro dedicava na sua secção Viagens no Paiz sete páginas a Tomar que começavam assim:


                                           

 e terminavam desta maneira:


                                            


A viagem em comboio expresso à pitoresca e histórica cidade de Tomar seria, pouco mais ou menos,como o descrito abaixo na imprensa tomarense.


O Coreto onde a Banda do Regimento de Infantaria 11 tocou e alguns dos monumentos que os excursionistas terão visitado, em baixo (página do  Branco e Negro )












11.04.1897


18.04.1897

16 de março de 2016

Cardeal e Governador Civil em Paialvo - Festa em Santa Maria dos Olivais


A igreja de Santa Maria dos Olivais nos finais do sec. XIX

Já aqui tínhamos visto que a Igreja de Santa Maria dos Olivais ameaçava ruína quando em 1895  fora visitada por uma  Comissão dos Monumentos Nacionais, composta por  Gabriel Pereira, Ramalho Ortigão e Júlio Mardel, a qual se comprometera a diligenciar os seus arranjos. 
E assim aconteceu, como as notícias abaixo revelam.
Nesta conformidade,  numa madrugada (que desconchavo de horários de comboios, santo Deus) de um domingo de Maio, lá se encontraram na nossa Estação de Paialvo sua Eminência o sr. Cardeal Patriarca e o sr. Governador Civil (note-se que, na notícia, nem a ordem de apresentação das duas individualidades é esta, sendo a contrária,  nem se prima pelo uso de maiúsculas - o que significa que até a redacção e a grafia variam conforme a importância que se vai dando, no tempo, aos personagens; na época o clero era coisa de somenos face ao poder civil, situação que teve altos e baixos,como sabemos, ao longo destes cem anos decorridos. Actualmente, atendendo ao lugar ocupado pelos políticos na graduação social, tudo lhes passa à frente,coitados!).
Pois lá foram estes dois dignatarios, que vinham a Tomar proceder à inauguração da igreja renovadarecebidos na gare pela câmara municipal, administrador do concelho, alguns eclesiásticos e muitos cavalheiros, enquanto a filarmónica de Paialvo os saudava com o Hino da Carta e subiam ao ar muitos foguetes. Nada de novo até aqui.
Também pressentimos o costume quando lemos que a Filarmónica Tomarense os recebe à entrada da cidade. Confere. Porém, a coisa começa a descondizer  quando vemos que aquela acompanha o sr. Cardeal Patriarca até à residência do sr. Padre José Martins da Silva Conceição, onde ficou hospedado. Sem mais. Só!? Então e o resto, e a minha marche aux flambaux? A padralhada, como então se dizia, não tinha direito a um cortejosinho "todo iluminado"? E não é que não tinha mesmo!! Então não querem saber que depois de arrumarem o pobre do cardeal e mais o padre seu anfitrião, em casa deste,  desatinam no tal "delírio" de que já temos conhecimento, pelas ruas habituais, até ao hotel onde a outra filarmónica, a Nabantina, toca o  hino e se seguem as girândolas e tal e tal!?
Mas estou quase esclarecida. Aqui há dias eu pedia ajuda para compreender esta intrigante e radiante marcha nocturna. Apesar das achegas, que agradeço, não cheguei lá. Parece-me, agora, que a alegre marcha assentava em muito cozinhado  com avental onde não costumava caber o clero, pelo menos o institucional. O que, pensando bem, até se compreende em terra de Templários. A propósito, tenho também que agradecer ao meu irmão J.J., quando me dizia que isto era um exemplo de como os tomarenses mantinham o gosto por marchar à luz de archotes. Pois fazem bem, até talvez representem a pureza original do que quer que seja. Mas sem Filarmónicas, nem vivas, nem damas à janela? Com todo o respeito, uma sensaboria! Prefiro as minhas, "as legítimas" de finais de oitocentos, quero lá saber se andavam ou não a desfilar com esquadros e compassos debaixo do braço.  (MFM)

4.04.1897



23.05.1897

14 de março de 2016

5.º Congresso Internacional da Imprensa, Porto da Lage e Discurso em Francês



Em Setembro de 1898 realizou-se em Lisboa o 5.º Congresso Internacional da Imprensa.  Acontecimento importante descrito, durante os dias do ocorrido no   Diário Ilustrado e,  no mês seguinte, no periódico O Occidente  

Dentro do programa das festas que esperava os congressistas constava uma excursão a Tomar, conseguida graças aos bons ofícios de Vieira Guimarães,  que incluía um almoço no Claustro dos Filipes no Convento de Cristo e uma visita à Fábrica de Fiação.
E assim, de acordo com o previsto, no dia 30 de Setembro lá chegaram os distintos convidados à estação de Paialvo, onde a Câmara Municipal de Tomar, na pessoa do seu presidente J.Torres Pinheiro, lhes deu as boas vindas, pronunciando em francês, as seguintes palavras (1):


Mesdames, Messieurs:
- La municipalité de Thomar vient, au nom des habitants de ce departement, 

vous souhaiter la bienvenue et vous exprimer sa gratitude pour la distinction 
dont vous l'honorez par vôtre visite.
- Thomar, la gracieuse riveraine du Nabão, ne peut pas vous offrir la brillante

et solennelle reception que vous meritez, ni les raffinements de luxe aux quels
vous êtes habitués; mais dans le modeste accueil qu'elle vous fait, elle désire 
et s'éfforcera  de vous montrer les sentiments hospitaliers, qui sont le blason 
de  cette ville si visitée dans ces derniers temps et que sont également la 
gloire de tout le peuple portugais, peuple chevalier et genereux par tradition
 et par tempérament.
- Vous admirerez ici des monuments anciens et modernes, qui sont des 
merveilles d'art et de travail. Dans les premiers, réliques d'un glorieux passé,
 dans leurs admirables scultures, dans les dentelles de pierre noircie par une 
existence séculaire, vous retrouverez écrits quelques uns des événements les
 plus importants de l'histoire du Portugal; dans les derniers, oeuvres du 
progrés et de la civilisation moderne, vous aprecierez tous les 
perfectionnements de l'industrie nationale: et à côté de ces monuments, 
que Thomar est fiére de posséder, vous admirerez combien la Nature a été 
prodigue pour ce doux coin de paysage nabantin, qui enchante tous ceux 
qui le contemplent. 
- Mesdames, Messieurs, vous étes les personifications lumineuses de la 
science, de la civilisation et du progrés ; vous représentez la presse du 
monde entier; allez donc dire à vos compatriotes, que vous avez trouvé 
dans cette petite ville de l'Extremadure portugaise, des personnes qui savent 
admirer, aimer et respecter ceux qui étudient et qui travaillent. Et si vous le 
faites et certainement vous le ferez, Thomar sera satisfaite, comme elle 
espere que vous le serez de la visite dont vous l'honorez.



O distinto presidente da Câmara Municipal
autor e leitor do discurso - João Torres Pinheiro



A Fábrica de Fiação (ilustração da época) que os congressistas tiveram ocasião de visitar, assim como ao Convento de 
Cristo, abaixo em gravura também da época.





Anteriormente, a imprensa tomarense anunciara  a forma como a notícia do futuro acontecimento fora celebrada (leiam, apesar de já não ser uma surpresa para nós, testemunhas presenciais que nos estamos a tornar com a experiência) e intimara, isso mesmo intimara veementemente, os politiqueiros tomarenses a esquecerem dissenções internas e questiúnculas ridículas, primeiro para não irritarem o S.Pedro (um dia com chuva não deixaria, com certeza, de ofuscar os festejos preparados) e depois porque, prontos, era feio portarem-se mal, brigarem, dizerem mal uns dos outros à frente de estranhos. Aquela gente era inqualificável, uns selvagens, não tinham maneiras, vejam como eram capazes de aproveitar a presença de terceiros para expor as guerras intestinas, enfim, coisas de antigamente, agora não se vê nada assim!! Nos nossos dias imperam, entre quem nos representa, os valores democráticos, as forças antagónicas respeitam-se e cumprimentam quem ganha, não há ressentimentos nem quem faça "ridículas cenas de opereta" muito estúpidas e malcriadas face a actos institucionais fundadores da democracia, como a tomada de posse de um presidente eleito pelos portugueses, só para mostrar que existe. Pois, volto a dizer, coisas de antigamente!
 Infelizmente a Memória Digital não tem publicações a partir desta data, de modo que ficamos sem saber os detalhes da honrosa visita e se, no fim, os tomarenses se portaram bem ou mal.(MFM)



28.08.1898





28.08.1898


4.09.1898



4.09.1898

(1) J. Torres Pinheiro, Quatorze anos da Administração Municipal, pgs. 65 a 67, 1920, Typografia Castro Irmão, Lisboa

10 de março de 2016

Regozijo - Fim da Revolta no Brasil -10 de Março




18.03.1894

Não fora eu andar entretida a escarafunchar quem entrava e saía pela Estação de Paialvo no período áureo desta, e nunca saberia da existência do sr. José Pereira Prista Sobrinho e seu estimado irmão os quais, devido à extremada amizade de ambos e ao regosijo do primeiro por via do segundo, me deram a conhecer, a mim e a alguns leitores do blog (outros sabem tudo), uma dissensão ocorrida nos finais de XIX entre os nossos irmãos brasileiros. Tratou-se da Revolta da Armada que, felizmente para a família do sr. José Pereira Prista Sobrinho, para os oficiais sublevados não tanto, levou à rendição destes últimos em 10 de Março de 1894.
Ora esta ocorrência, embora importante, não aparece aqui porque a boa nova tenha aparecido em Tomar através do Caminho de Ferro (embora depois, penso eu, os jornais com a descrição de todos os pormenores, tenham chegado, através do comboio correio a Porto da Lage) pois, como vemos, a notícia chegou por telegrama. O telégrafo é, em Portugal, anterior ao comboio e a estação de Tomar foi das primeiras do país, ficando localizada numa elevação que se passou precisamente a chamar o Telégrafo, perto das actuais Algarvias. Voltando ao que estava a dizer, o que me impressionou nesta notícia foi a facilidade com que qualquer cidadão (embora eu suspeite que o sr. José Pereira Prista Sobrinho não fosse um cidadão qualquer), para festejar um acontecimento pessoal, pusesse a banda (a mandasse saír) a tocar e os foguetes a troar para gáudio da população em geral (rimou mas ficou bem, veio a propósito). O que me parece é que a burguesia endinheirada do sec. XIX era mais amiga de partilhar as suas alegrias com a populaça do que a actual! Nascia o herdeiro, formava-se o sobrinho, acabava a escaramuça lá na terra do mano, banda na rua, girândolas no ar, festa para todos.
Olha se agora fosse assim? Como não conheço os tomarenses ricos, façamos o exercício com os nacionais. Nasce um neto ao sr. Américo Amorim. Quem o sabe? As revistas cor-de-rosa que dão conta dos festejos do baptizado na igreja tal, no restaurante não-sei-quantos já o caso está requentado. Ora assim muito obrigada, mandou ele desfilar a Madonna e a Lady Gaga e afins pela Avenida da Liberdade, cantando a celebrar o evento para regosijo das gentes? Não mandou! E o Cristiano que até já foi povo e tudo? Por acaso oferece concertos do Tony Carreira quando festeja o emagrecimento de manas e mãe? E a sôdona Isabel dos Santos, comemorou a vitória do papá sobre o golpe de estado daqueles rapazes em que um ficou cheio de fastio durante algum tempo o que até o ajudou porque ficou um top model, dando um mega-concerto na cidade do Porto, que é casa da família, com os óculos do sr. Abrunhosa que andam por aí a chamar pela mãe, coisa que deixa o povo comovido? Ah pois não! 
O quê, a populaça esclarecida não ia reagir bem?! Pois, é capaz, o povo, ingrato, quando pensa só se prejudica. 
O que lhe vale é que o poder, o legítimo, o instituído, lhe continua a fornecer a música que gosta. 
E agora até temos um presidente que, além do mais, nos oferece cantorias para todos os gostos (acho que se diz transversais), viram ontem - que indomável inquietação? tão querido! (sem ironia, eu gosto dele, Deus Nosso Senhor lhe conserve aquele jeito,e a nós também, Amen) (MFM)



A Revolta da Armada foi uma rebelião iniciada por algumas unidades da
  Marinha do Brasil contra o governo do presidente da república marechal
Floriano Peixoto (1839 - 1895) (na foto)




9 de março de 2016

9 de Março - Grande Guerra -100 Anos


A 9 de Março de 1916 Alemanha declara oficialmente  guerra a Portugal depois do Estado Português, a pedido da Grâ-Bretanha, ter dado ordens de apresamento de todos os navios alemães e austro-húngaros que estavam ancorados na costa portuguesa.
Nesta sequência o Corpo Expedicionário Português será enviado para a  2ª fase da 1ª Guerra Mundial em 1917. Responde assim afirmativamente à nossa velha aliada Britânica e à necessidade de Afonso Costa afirmar o seu poder político tanto em relação à oposição interna republicana como às forças monárquicas no exílio. O pretexto foi defender as colónias de uma possível penetração militar alemã, embora ali o conflito já durasse desde 1914, tendo sido já para lá enviados reforços militares. Um exercito de homens mal equipados, mal preparados e pouco motivados é então lançado na fase mais mortífera da guerra e um terço fica para sempre nos Campos da Flandres; registaram-se cerca de 10 000 baixas e um número elevadíssimo de feridos e doentes (mutilados, gaseados e tuberculosos). 



 "em 2 de Fevereiro de 1920 foi recebida da 5.º repartição da Direcção Geral dos Serviços Administrativos do Exercito uma relação dos soldados deste concelho mortos durante a Grande Guerra". (in Anais do Municipio de Tomar  1901-1925)


Lançamento da primeira pedra para a construção do
 Monumento ao Soldado Desconhecido, em Tomar.




Monumento aos Mortos da Grande Guerra, Inaugurado em 11 de Novembro
de 1931 da autoria do 
 escultor Henrique Moreira.


Primeira fotografia não datada de origem desconhecida, outras imagens retiradas daqui


7 de março de 2016

Vieira Guimarães e Porto da Lage



   
Vieira Guimarães, já aqui falado numa iniciativa sua, terá vivido na gare da Estação de Paialvo um dos dias, melhor, uma das noites mais significativas da sua vida.
Termina em 23 de Julho de 1897  o  curso de Medicina, defendendo a tese intitulada  Dispepsia sarcínica, acontecimento que terá deixado grande parte dos tomarenses eufóricos e capazes de fazerem subir ao ar algumas girândolas de foguetes, coisa para a qualcomo já vimos, não era preciso muito para acontecer, bastava estarem contentes, o que não deixava de ser inocente e comovedor, seria  bonito de se ver, não trazia mal ao mundo e punha felizes os povos. Ainda bem.
Mas toda aquela alegria não foi dito que cresceu exponencialmente no dia do retorno à terra mãe do novel doutor porque à época a expressão não se usava, ou porque se sabia muito matemática ou porque só se falaria do que se sabia, mas a verdade é que, afirmou quem viu, aquele meu conterrâneo foi alvo de uma manifestação de  simpatia e regozijo das mais imponentes e entusiásticas a que a testemunha do ocorrido presenciou. Pois numa madrugada de um domingo de Julho, a banda Nabantina, na Estação de Paialvo, cá está ela, ao avistar-se a locomotiva [que transportava o doutor] rompeu com o hino nacional  no meio do estalejar dos foguetes. Seguiram-se ali mesmo, na gare, os abraços de parabéns dos amigos e o, muito especial e emocionado, do pai.
Mais tarde, ao cimo da Rua da Graça, a filarmónica Tomarense junta-se à primeira e forma-se então a bendita marche aux flambaux, que leva, como já vimos que era costume, as gentes ao delírio! Imaginemos o cortejo, flamejante nas suas velas (também me falaram em archotes, mas teimaram mais nas velas) transbordante de vivas ao homenageado e a Tomar, a musica das bandas a competir como trovejar dos foguetes, as flores lançadas das janelas sobre o novo médico pelas mãos poéticas das damas! É de uma pessoa desejar uma máquina do tempo (com garantia de regresso rápido que, no que me diz respeito, só lá me leva a marche aux flambaux, o resto são tempos que dispenso)!!! (MFM)


18.07.1897
                                            
25.07.1897
                                             
25.07.1897
                                       





José Vieira da Silva Guimarães, nasceu em 1864 em Tomar, local onde viria a  falecer em 1939. Foi médico, professor do Liceu Camões em Lisboa, historiador, sócio da Academia das Ciências de Lisboa. Mas  foi, sobretudo, um grande amante da sua terra. Toda a sua vida divulgou Tomar e os seus monumentos, com a mesma insistência com que pugnou pelo seu desenvolvimento, sendo um insistente defensor de melhorias nas industrias e nas vias de comunicação locais. Os seus estudos enquanto historiador versaram principalmente os Templários,  a Ordem de Cristo e os respetivos monumentos, sendo algumas das suas mais reconhecidas obras, as seguintes:

O poema de pedra de João Castilho em Tomar;
- Thomar – Notícia Histórico – Archeológica e Artística do Monumento de Christo e das Egrejas de Santa Maria dos Olivais, de Santa Iria e de S. João;
- A cruz da ordem de Cristo nos navios dos descobrimentos Portugueses;
- O monumento de Cristo, em Tomar, e as missões religiosas;
- Thomar e o além-mar;
- Marrocos e três mestres da ordem de Cristo;
- O Século XII e a Fundação do Castelo de Thomar;
- A trilogia monumental de Alcobaça, Batalha, Thomar e o caminho de ferro;
- A Ordem de Cristo;
- O claustro de D. João III em Thomar.


Recortes de imprensa retirados de Memória Digital de Tomar. A fotografia  é uma montagem da capa de um dos livros publicada no "O Occidente".

3 de março de 2016

Quintanistas de Medicina em Porto da Lage

Os dezoito alunos do quinto ano da Escola Médica Cirúrgica de Lisboa decidiram, em Abril de 1897, vir realizar o seu jantar de despedida a Tomar. Aí, foram recebidos ao cimo da Rua da Graça pela Banda Filarmónica que tocou o hino da Carta enquanto no ar iam subindo girândolas de foguetes! Acto contínuo formou-se uma marche aux flambaux (alguém me explique, por favor, o que é isto para eu não morrer completamente ignorante destes hábitos oitocentistas) que acompanhou os jovens ao hotel.
Mas atenção! Toda esta alegre movimentação se passava pela bonita hora primeira do aprazível dia que ora nascia! Porque antes, e é isso que nos faz trazer aqui a rapaziada fina do quinto de medicina, esta tinha-se apeado proveniente da capital  na gare da estação de Paialvo, claro!
Ora leiam e admirem como se passaram dois dias que eram só para ser um, ou três noites que eram duas,se não contarmos com o baile, enfim, leiam ....








"...sendo aguardados ao cimo da Rua da Graça...











... formou-se uma marche aux flambaux que os acompanhou seguindo pela Rua da Graça, Everard e Serpa Pinto ...


Rua Everard (levada)


Rua Serpa Pinto (Corredoura)

No dia seguinte visitaram os monumentos, fábricas, museu Silva Magalhães .....

Museu Silva Magalhães.

De tarde passearam de barco no rio Nabão.




Na quinta-feira, antes de retirarem foram aos Paços do Concelho procurar o sr. João Torres Pinheiro, presidente da câmara,....






















....às três horas da tarde retiraram desta cidade ....





FIM


Recorte de imprensa e fotografias  provenientes de Memória Digital de Thomar.

1 de março de 2016

Porto da Lage - Palco de Manifestação

Desde o seu inicio, em Maio de 1864, até Setembro de 1928, data em que começou a operar a estação de caminhos de ferro na cidade de Tomar, a estação de Paialvo foi o entreposto das entradas e saídas na cidade, de e para os grandes centros. Num país sem estradas em que o caminho de ferro era a grande via de circulação, durante mais de 64 anos pisaram a  gare da Estação, como então se dizia, os moradores de Tomar que pretendiam deslocar-se a Lisboa, ao norte ou até ao estrangeiro e, em sentido contrário, desembarcavam em Paialvo todos aqueles que, provenientes de fora, pretendiam ir a Tomar em negócios ou em visita, o turismo interno começava com a iniciativa dos grupos excursionistas.
Mas não eram só os habitantes de Tomar a usufruir da estação de Paialvo, parte da região hoje chamada do "Pinhal Interior", que incluía as vilas de Ferreira do Zêzere, Sertã, Vila de Rei, Oleiros, Alvaiázere, Ansião, Figueiró dos Vinhos, estava ligada através de trens e carroças de aluguer ao caminho de ferro localizado precisamente em Porto da Lage, onde se situava, como é sabido, a estação de Paialvo.
Mas relativamente a Tomar, a estação funcionava como a porta de entrada. Ali se deslocavam as figuras gradas da cidade,acompanhados muitas vezes das bandas de música e de foguetes, para receberem o rei , a  rainha , marqueses e todos os que justificavam uma recepção especial, até notáveis filhos da terra. Nos próximos posts vamos dar conta, com base em notícias que foram saindo na imprensa, de situações em que a gare da estação de Paialvo esteve em destaque devido a personagens que por lá foram passando.


Em 16 de Dezembro de 1894, a gare da Estação de Paialvo encheu-se literalmente de gente que dava vivas à Pátria, à Liberdade e à Comissão. A Philarmónica Nabantina tocou a Portugueza e muitas dezenas de foguetes foram lançados ao ar. Um verdadeiro delírio!


23.12.1894
                                                       

A Comissão dirigia-se ao Porto onde, naquele mesmo dia, no comício de protesto presidido pelo conde de Samodães, no teatro do Príncipe Real, José de Alpoim pede que se hasteie para todos uma única bandeira, a bandeira da Democracia, bandeira que não se confunda com o estandarte real, que seja a bandeira da pátria. 
Tratava-se de um Comício de protesto contra o encerramento das Cortes, o qual ocorrera a 28 de Novembro e assim permaneceria até Janeiro de 1895. Era patrocinado por republicanos e progressistas que se uniam desencadeando importantes comícios anti-governamentais. Na semana anterior ocorrera o de Lisboa, no Campo Pequeno.  


Comício de 9 de Dezembro de 1894 no Campo Pequeno, croquis de Roque Gameiro, publicado no jornal "O Século. "
                           


24 de fevereiro de 2016

Diagnósticos Médicos e Mães Gordas




24.10.1897


O aluno de Medicina a que esta notícia alude, é o futuro Dr.Cândido Madureira que dá hoje nome a uma rua de Tomar, a antiga Rua da Graça que eu sempre conheci oficialmente com o nome novo mas à qual sempre chamei, e chamo, pelo nome antigo.


Lembro-me muito bem do filho, o sr. António Madureira, homem de cavalos como o meu pai, e de um dos filhos deste, de alva branca, durante a minha adolescência, a cantar lindamente na Igreja de S.João Baptista, e vejo muitas vezes, agora, um dos bisnetos a apresentar notícias num canal de  televisão. Família conhecida, portanto.
E o conhecimento vem de longe. Sendo o meu pai muito pequeno, ainda nos anos vinte do século passado, muito frágil e magro, a mãe, preocupada, levou-o ao médico. Dizia minha avó que, por essa época, seria muito gorda o que, não tendo fotografias para ilustrar, custava muito a crer - a minha avó Maria José gorda???, mas enfim, se ela o dizia... Pois lá foi a minha avó anafadinha acompanhada do filho magrinho à consulta do sr. Dr. Cândido Madureira. Exposta a questão, o médico, que se mantivera entrementes  de braços traçados, displicentemente a ouvir, mirou a mãe da criança de cima abaixo e murmurou sarcástico:
- Pois, coma eu! Se sobra para pôr no prato do pequeno pouco importa!
E assim, com estas palavras, aquele futuro distinto médico tomarense traçou a sua fama na pedra da memória da honesta família tomarense a que eu pertenço. Que aqui deixa, através de mim, o seu testemunho. (MFM)

22 de fevereiro de 2016

João de Deus - 120 Anos da sua Morte

19.01.1896

João de Deus de Nogueira Ramos (1830-1896), mais conhecido por João de Deus, um eminente poeta lírico, considerado à época o primeiro do seu tempo, foi uma das figuras mais populares do último quartel do século XIX português, autêntico fenómeno de culto, alvo das maiores homenagens ainda em vida. Na sua morte assistiu-se "à maior manifestação de dor dada por um país inteiro à memória do seu mais ilustre filho", como refere a notícia acima.
Poeta romântico, as suas poesias são de um lirismo encantador, cheias de ritmo e de musicalidade. Quem não acha maravilhoso, e não sente,  na sua simplicidade e no seu significado  este Sempre?

Nem te vejo por entre a gelosia
Nunca no teu olhar o meu repousa
Nunca te posso ver, e todavia
Eu não vejo outra cousa!

João de Deus escreveu também lírica satírica de intervenção social e política. Eu sabia de cor, nos tempos de liceu  ...com que então caiu na asneira/ de fazer na quinta-feira/ vinte e seis anos, que tolo/, ainda se os desfizesse/,mas fazê-los não parece/de quem tem muito miolo/ etc

Na mesma linha humorística, é o seguinte:

Mal de Pés

Certo patrício nosso brasileiro,
Depois de ter corrido o mundo inteiro
Ao voltar de Paris desenganado
Dos médicos, que tinha consultado,
Achou-se num wagon com um inglês,
O desgraçado tinha mal de pés.
E a última palavra da ciência
Era ir vivendo e tendo paciência!
Mostrou-se o bife incomodado,
Fungando para um e outro lado…
Como quem busca o foco de infecção;
Diz-lhe o nosso infeliz compatriota,
A apontar-lhe com o dedo a bota
E exalando um suspiro de paixão:
– Eis a causa, senhor, eis o motivo!…
O que eu não sei é como ainda vivo!


Tenho gasto rios de dinheiro,
E sempre, sempre, sempre o mesmo cheiro!
E isto por ora vá!… mas alto dia
Quando aperta o calor… Virgem Maria!…
“E diga-me: em lavando os pés refina,
Ou sente algum alívio?”
– “Isso não sei,
Sei que tenho exaurido a medicina;
mas lavar é que nunca experimentei.”

Às vezes dá-se ao médico o dinheiro

Que se devia dar ao aguadeiro.

19 de fevereiro de 2016

O Piropo e o Comandante de Infantaria 11




Jornal A Verdade 7.09.1879

Pois, se calhar o sr. Comandante de Infantaria 11 não tomou as providências necessárias,ou se tomou não chegaram, ou então o senhor não chegava para as encomendas que eram muitas e duraram muitos anos ou, prontos, se calhar o senhor morreu ou assim,e por isso foi dada uma nova redacção ao artigo 170.º do Código Penal.
A sério, a geração de mulheres que agora mais se indigna, com aquilo a que chama piropo, mostrando-se agastadas ao ponto de cair no ridículo (e é fácil meninas, eles andem aí, para nos respeitarem no mundo deles temos sempre que valer MUIIIITO mais), pois dizia eu, essas mulheres desconhecem o que já lá vai!!!
Milhares de filhas e netas das raparigas da notícia de 1879 foram obrigadas a continuar a ouvir as bestialidades dos insultos saídos das bocas dos descendentes dos desgraçados soldados de então. Chamávamos-lhes "feijões verdes", à chusma  de soldados que,como os seus avós,aproveitavam o intervalo da suas preparações para a guerra, para se pespegarem lado a lado, em filas imensas, na ponte e nas grades à beira rio, e fazerem-se ouvir pelas miúdas que passavam sem adultos (no fundo eram umas crianças, o medo que eles, todos eles, tinham de outras calças ou de uma mãe anafada que lhes arregalasse os olhos!). Mas o pior, tanto como me dizem as minhas memórias de adolescente numa terra de província,  nem era "a tropa", submetida ao poder disciplinar e receosa de queixas. Não contando com os "trolhas", os mestres de sempre nesta arte das "chufas", havia a tropa fandanga da hora de almoço, os estudantes internos do colégio, os mais velhos que tinham ordem para sair e os alunos da escola industrial. O jeito de ladear as ruas era igual ao dos outros, mas sobrava nestes o atrevimento que a boçalidade e a policia militar impedia nos primeiros. Não sei se haveria grande diferença entre o comportamento destes "estudantes" de 1960/70 e o dos soldados de cem anos antes. O que não havia, de certeza, era um comandante de infantaria que os pusesse na ordem!
Felizmente, hoje tudo se modificou, apesar das meninas, e muito bem, ainda quererem mais. Quarenta anos chegaram para alterar hábitos de centenas! 
Continua a espantar-me a  forma extraordinária como este país se transformou! 
Mas nem tudo era mau e, quando a chusma se desligava, isto é, quando deixava de o ser e o "macho lusitano" não tinha outro ao lado para o apoiar nos dislates, as relações entre os sexos podiam até ser como a natureza manda, a sedução imperar e aí, com autorização ou sem ela , era bem-vindo o piropo quando do estilo deste aqui abaixo (MFM)