Si hortum in biblioteca habes deerit nihil

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13 de julho de 2012

Os Homens Gloriosos




Sentei-me sem perguntas à beira da terra,
e ouvi narrarem-se casualmente os que passavam. 
Tenho a garganta amarga e os olhos doloridos:
deixai-me esquecer o tempo,                                               
inclinar nas mãos a testa desencantada,
e de mim mesma desaparecer,
— que o clamor dos homens gloriosos
cortou-me o coração de lado a lado.

Pois era um clamor de espadas bravias,
de espadas enlouquecidas e sem relâmpagos,
ah, sem relâmpagos...
pegajosas de lodo e sangue denso.
Como ficaram meus dias, e as flores claras que pensava!
Nuvens brandas, construindo mundos,
como se apagaram de repente!
Ah, o clamor dos homens gloriosos
atravessando ebriamente os mapas!
Antes o murmúrio da dor, esse murmúrio
triste e simples
de lágrima interminável, com sua
centelha ardente e eterna.
Senhor da Vida, leva-me para longe!
Quero retroceder aos aléns de mim mesma!
Converter-me em animal tranquilo
em planta incomunicável,   
em pedra sem respiração.                                      

Quebra-me no giro dos ventos e das águas!
Reduze-me ao pó que fui!
Reduze a pó minha memória!

Reduze a pó
a memória dos homens, escutada e vivida...


Cecília Meireles, 1901,1964 , in 'Mar Absoluto'









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