Continuando o assunto do post anterior vejamos agora neste a forma prática da sua aplicação.
A Carta determina ainda que se transmite na irrevogável e pura venda toda a posse e domínio que nas referidas oliveiras tinha a Corporação para o arrematante, seus herdeiros e sucessores]?] as gozem, possuam e desfrutem como próprias.
Este negócio do Estado é o exemplo do que acontece quando os regimes mudam e, cheios de "generosidade" retiram bens a quem está, no momento, do lado errado da história. Fora assim em Portugal no Liberalismo com os bens das extintas ordens religiosas, os quais foram vendidos ao desbarato a capitalistas pouco preocupados em cultivar terras, deixando de fora quem efectivamente as cultivava. Foi assim no fim da União Soviética e no início de países ex-colónias onde, alimentada com os despojos do passado, nasceu de imediato uma classe de oligarcas, havendo pouco ou nenhum beníficio para as populações. Em Portugal, à nossa medida quase anã, passou-se o mesmo neste micro-mundo da expropriação dos bens religiosos, sendo exemplo uma pequena freguesia rural com incidência especial nas "oliveiras em terra".
Senão vejamos, expropriadas que foram as oliveiras, por uma razão ideológica que impedia que um "Culto" detivesse bens materiais (os outros acho que deixava) o que poderia o Estado fazer com elas? A medida que pareceria mais justa seria dá-las aos donos das terras onde estavam plantadas, por um lado porque o mais certo seria as ditas oliveiras lhes terem pertencido algum dia e terem sido oferecidas a um Santo ou Santa em paga de algum milagre e aí o papel do Estado seria o de as restituir ao dono inicial, que fora lesado pela "falsa doutrina" do clero que o enganara, pelo que ajudaria a reparar um erro e ficaria bem visto; por outro lado porque, em boa verdade, o Estado não perdia nada, as oliveiras nunca tinham sido suas e faria uma excelente figura. Esta medida teria sido uma boa forma de propaganda política.
Mas como é dos livros que o Estado não nasceu para dar nada a ninguém (nem, no caso do nosso, primar pela inteligência), dou de barato que não desse as oliveiras, mas que as vendesse aos mesmos de que falei atrás. Ninguém se escusaria a comprar, ninguém gosta de ter na sua propriedade algo que não é seu, de lá ver entrar quem não quer quando quer, ninguém, enfim, quer ter problemas escusados. Seria então criada uma tabela de preços por oliveira a que se juntaria a respectiva e competente conta de contribuição de registo e emolumentos, que cada cidadão proprietário de pequenos olivais pagaria todo contente e aliviado. E uma vez que o inventário estava feito, nada disto encareceria o processo, pelo contrário, pois se, suponhamos, fosse fixado 1$50 por oliveira, seriam arracadados na operação 24$00 a que se acrescentariam as taxas, aplicando a cada uma $09, seriam 1$62. O Estado ganharia então 25$62, face ao que ganhou na realidade com a arrematação - 20$59. Multipliquemos agora a diferença por todas as outras "oliveiras em terra" da Freguesia, depois do Concelho, do Pais. Façamos a mesmo exercício para outros bens e produtos análogos..., não, não vale a pena, You got the idea.
Não, o governo da República não tem que me agradecer a assessoria económica e política retroactiva, foi um gosto. Sou uma patriota (republicana até). Mas já não fomos a tempo. A especulação e a ganância já começaram. O Estado tratou de arranjar intermediários que farão o que ele poderia ter feito, mas pelo preço máximo, e perdendo dinheiro com isso.
Intermediários que fizeram o raciocínio simples e sensato que eu fiz. Que concretizaram o negócio ideal, um investimento limpo e sem riscos - compra-se sabendo haver clientes certos e dispostos a pagar tudo. Só quem não podia é que não se metia nele, só não via quem não queria - O Estado! Será que não via mesmo? (MFM)
*António Augusto Mota nasceu em Porto da Lage em 25 de Junho de 1897 filho de Augusto Pereira da Mota e Maria José de Sousa Rosa, de quem já temos falado neste blog. Foi uma figura social e economicamente proeminente em Porto da Lage, destacando-se a sua ligação à fábrica de Alcool.
Nota: Agradeço a H.C.M. a disponibilização dos documentos acima.
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