Si hortum in biblioteca habes deerit nihil

Si hortum in biblioteca habes deerit nihil
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11 de abril de 2012

Dr. Henrique Pereira da Motta -Médico de Porto da Lage



O Pantaleão Faria hoje cem anos um dos mais queridos estudantes de Coimbra do seu tempo, onde viveu na Real República Ribatejana. Foi um estudante boémio que conseguiu conciliar o trabalho com a paródia e a graça com a elegância; estava tão à vontade em casa do lavrador como nos salões nobres.
Foi “padrinho” de “O Ponney” um jornal satírico da academia: “S. Ex. o Magnífico Reitor ... foi a Lisboa; ficou instalado no João do Grão...”
Recordo um das inúmeras partidas que congeminou: durante a Queima, ele e o seu amigo Castelão d’Almeida, ambos quintanistas vestidos a imitar lentes, pediram licença para jantar “de Borla e Capelo” no restaurante do Astória. O maitre, surpreendido, aquiesceu sorridente e indicou-lhes a mesa.
No fim, discursaram elogiando-se mutuamente, despediram-se de toda a gente e preparavam-se para sair quando o maitre, contrafeito, fez tenção de lhes entregar a conta.
Em voz alta, manifestaram surpresa, dado que lhes tinha sido concedido jantar “de borla” como qualquer dos ilustres hóspedes poderia testemunhar...
A graça foi compensada; logo houve quem se prontificasse a pagar a conta ...
Foi nesse ano que começou a “Venda da Pasta” em favor do Asylo da Infância Desvalida do Doutor Elísio de Moura, seu professor. Quando me encontrava, queria saber se o Pantaleão “continuava lúcido” ...
Foi um clínico geral notável em Porto da Lage, sua aldeia natal, tendo continuado a conciliar uma dedicação e uma competência exemplares com um espírito brilhante, em especial quando deixou de fumar.
Um dia, parou o carro em local proibido, à frente dum café. A um polícia, que o conhecia e lho fez notar, explicou ir tratar um doente. Tomado o café, ia a entrar no carro quando o polícia lhe perguntou, melindrado:
--Com que então, ia tratar um doente...?
--Era verdade, o doente era eu que precisava dum café....

Morreu há 24 anos, era meu pai e foi meu mestre
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Texto publicado pelo professor Henrique Carmona da Mota em 14.01.05 aqui