Si hortum in biblioteca habes deerit nihil

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24 de setembro de 2018

Padre Nicolau outra vez


Dulcinda Teixeira já nos tinha deixado, aqui  e nos posts seguintes, uma pequena biografia e algumas histórias sobre o famoso Padre Nicolau, pároco da freguesia da Madalena durante décadas. Manuel Maria Azevedo Mendes Mourão, cuja família paterna é sobejamente conhecida em Cem Soldos, enviou-nos, agora, não só uma fotografia daquele sacerdote como mais duas deliciosas histórias, que lhe contaram, sobre o mesmo.



Fotografia do padre Nicolau,  de 1938 ou 1939 ,tirada pelo Eng. Nuno Mourão
 quando este era ainda estudante . 


A foto em referência fez parte de uma exposição fotográfica e documental organizada e apresentada por Manuel Mourão, filho mais velho do Eng. Nuno Mourão, em 2010. Esta exposição com o título "Nuno Mourão (1920-1965) Olhares e Vivências duma Vida que Conta" foi inaugurada em 19 de Junho de 2010 - data em que o seu  pai faria 90 anos, em Cem Soldos.






Quanto às histórias, diz Manuel Mourão:


« No primeiro dia da abertura ao público da exposição “Nuno Maria Godinho Mourão (1920-1965) – Olhares e vivências duma Vida que Conta” apareceram várias dezenas de pessoas e o Senhor José Ferreira contou-me a seguinte história :

O Padre Nicolau, prior da freguesia da Madalena e residente em Cem Soldos, costumava deslocar-se num cavalo emprestado pelo Dr. Henrique Gonçalves para prestar assistência religiosa nas diversas aldeias da freguesia. Num fim de tarde, estava ele numa dessas aldeias, o tempo toldou-se e anunciava uma trovoada iminente. O nosso bom prior tinha terror das trovoadas e por isso um paroquiano solicito logo se ofereceu para o ir levar a casa de Lambreta antes que estalasse a borrasca. Quanto ao cavalo, encarregaram o rapazinho que o acompanhava como sacristão (era o próprio narrador da história) de reconduzir a montada a sua cavalariça em Cem Soldos. O rapazinho nunca tinha tido a oportunidade de montar um cavalo, mas lá se aventurou e meteu-se ao caminho. Às tantas rebentou mesmo a borrasca e um raio risca nos céus seguido de estrondoso trovão. O cavalo empina-se, atira o rapaz e a sela mal apertada ao chão e dispara a galope só parando nas cavalariças. As gentes de Cem Soldos ao verem o cavalo naquela correria e sem sela, depreenderam que o Padre Nicolau estivesse caído e eventualmente magoado algures no trajecto. Logo alguns se meteram ao caminho, não se apercebendo que o sacerdote já estava em descanso e em segurança na sua casa, trazido pelo condutor da Lambreta. Encontraram, isso sim, o pobre do José Ferreira que caminhava um pouco combalido e com a sela às costas.

Outra história, contada pelo mesmo José Ferreira:

Ao fim da tarde, era costume três respeitáveis anciãos da terra sentarem-se num banco no Largo de Cem Soldos gozando o fresco e em amena cavaqueira, muitas vezes acompanhada de sonoras gargalhadas. Eram eles o Padre Nicolau ainda exercendo o seu múnus sacerdotal, apesar de já velhote, o Dr. Henrique Gonçalves e o Professor Mário Mourão, ambos viúvos e já reformados das suas lides profissionais.
Numa dessas tardes um rapazinho mais afoito ousou aproximar-se e tentar escutar a conversa. Logo o Padre Nicolau o caçou e enfiando-o debaixo da sua sotaina disse com um ar agastado: “isto não são conversas para crianças”. Depois lá libertou o rapaz que fugiu espavorido e intrigado ficando sem saber o motivo daquela exclusão. Será que os três anciãos se divertiam a contar anedotas brejeiras uns aos outros?»