Si hortum in biblioteca habes deerit nihil

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28 de dezembro de 2021

Nada de Novo Debaixo do Céu

 

      Há trezentos anos certos reinava em Portugal El-rei D. João V, chegavam regularmente carregamentos de ouro do Brasil, construia-se o Convento de Mafra e a Gazeta de Lisboa anunciava o décimo  aniversário da Senhora Infante Dona Maria, filha de Suas Magestades, que Deus os guarde, por cujo motivo houve beija-mão e gala no Paço. Mas aquele periódico, que recomendo a quem, como eu está farta do presente e que soube agora, graças à clarividência e generosidade do sr. Almirante, que o futuro ainda não se realizou (sic), declarações que ainda me empurraram mais para outra dimensão não sei qual mas qualquer uma diferente da habitada por estes índigenas, parafraseando quem já cá não está e faz muita falta, pois dizia eu, a Gazeta também nos dá notícias, naquele longínquo 5 de Dezembro de 1721, da peste que assola a França e do modo como a Grã-Bretanha dela se precavê. Leiam no original que é melhor e mais pitoresco. Mas se quiserem ortografia mais actual (embora não muito) aqui vai um excerto que nos mostra que, com excepção dos avanços científicos, não inventámos nada, mesmo nada, em França até já havia um Vice todo diligente como se quer! Ao contrário, retrocedemos. Onde está a vossa velha capacidade de planear, oh ingleses? Onde está o novo formulário de preces, como exigem as multidões carentes? (MFM)



....Quanto aos progressos da peste escreve Mons. de Quelús de Tarascon em data de 7 de Outubro que naquele distrito se não acham mais que algumas faíscas deste mal; e que está persuadido que se extinguiu de todo este veneno, que só havia dois ou três doentes em Salon o que ele atribui ao mau Regimento que tiveram; e que tinha mandado novamente expulsar as infecções das casas por meio de perfumes, que em Martigues havia três meses que tinham cessado as doenças e que tinha acabado a quarentena e que o mesmo tinha sucedido em Tarascon, por cuja razão se levantou o bloqueio e que se fez a vindima sem algum acidente mau, que em Aix devia acabar a quarentena em 10 do dito mês, que em Marselha tinha começado a sua; e Toulon faria brevemente o mesmo, com outros muitos lugares do seu termo, e que assim esperava ver restabelecida brevemente a boa saúde em toda a Provença, o que tudo confirma também Mons. Lebret em cartas de 3 e 6 de Outubro acrescentando as particularidades de que se acham sem doenças as vilas de .... .... Em Marvejois pelo parecer dos médicos está o mal na sua declinação porque se aumentava o número de convalescentes pois de 350 pessoas que estavam na enfermaria só cinco ou seis se achavam perigosas e de quatro até cinco (de Outubro) tinham só falecido três meninos. Na Abadia de Chanbom se tornou a acender esta epidemia falecendo o Prior em 24 horas e morreram depois dois monges, S.Genaix está muito mal e têm falecido neste lugar 40 pessoas. Em Mende desde 4 de setembro em que ali se declarou o contágio até 6 de outubro faleceram 182 pessoas em que entraram os dois últimos cônsules e tem havido dias em que adoeceram até 80 com bouboés e carbúnculos. As últimas cartas de Gevandan escritas em 23 de outubro referem que o contágio não é já tão violento naquela Comarca e que se espera que mediante o frio deste Inverno cessará totalmente o mal. Em Avinhão não é tão grande o estrago mas em razão das vindimas se dilatou o mal pelos campos vizinhos. O Vice-Legado mandou fazer uma quarentena geral que se começou com satisfação de todos os moradores, e se observa uma exacta vigilância, sendo ele mesmo quem vai por toda a parte dar as ordens necessárias.




.....El-rei querendo prevenir a comunicação do contágio nomeou a 20 deste mês (Outubro) um Tribunal composto dos membros do Conselho privado e dos médicos mais doutos desta cidade para ponderarem os meios mais convenientes de o evitar, e se expediram ordens para fabricar barracas na praia de Blackheath, junto a Greenwich, para se alojarem as tropas que devem impedir a comunicação com os Condados de Kent e de Essex, no caso que estas províncias, que são as mais vizinhas das costas de França, cheguem a padecer da desgraçada infecção. Este Tribunal se junta muitas vezes em conselho e tem proposto nele dar comissão a alguns cirurgiões e boticários para visitarem todos os corpos defuntos, em lugar das mulheres, que fazem esta função ao presente; e no caso que, não obstante todas as cautelas que se tomam, Deus seja servido afligir este reino com a calamidade da peste, se tem resoluto curar os infectos de um modo mui diferente do que até agora se usou na Europa, e em lugar de fechar ou tapar de pedra e cal as casas infectadas se levarão os doentes ao Piornal de Blackhear que é um sitio mui alto onde se armarão barracas para os curar e tratarão deles cirurgiões e boticários na forma de um Regimento feito no Colégio dos Médicos. Por ordem do Conselho se publicou um novo formulário de preces, que se deve ler em todas as Igrejas para implorar a Misericórdia de Deus para que nos preserve de semelhante castigo.