Si hortum in biblioteca habes deerit nihil

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12 de junho de 2012

A Noite de Santo António

Conversa ouvida esta tarde no autocarro, à beira do Marquês (trânsito dificil, já estava cortada a Avenida) :
Mulher de meia idade ( enfastiada) : - -As marchas! Sempre a mesma coisa! Quando é que acabam com isto?
Rapaz novo (olhar furioso, capaz de engolir a outra) - Sempre a mesmas, sempre melhores, sempre mais lindas. Viva as marchas!
- Viva, a marcha é linda! - resposta geral de muitas e variadas cores.

Esta não é uma festa "para turista ver". É o Santo António, são os Santos, como lhe chamam as novas gerações. Desde há mais de trinta anos que testemunho a autenticidade e o crescente entusiasmo  com que esta noite é festejada. O anátema de ser coisa criada e de antigamente (à António Ferro como o preconceito de alguma esquerda a quis empurrar, em vão, para guetos ideológicos) nunca colou porque era impossível colar, quando os protagonistas não podiam ser mais genuínos nem mais gingosamente "les-bo-etas". Que para se ser alfacinha não é preciso ser varina nem ardina! É vê-los correr da Amadora ou do Seixal a vir ensaiar a marcha do  bairro onde nasceram, à semelhança de qualquer tuga que volta à terra  pela Romaria do Verão! Corre-lhes no sangue, corre-nos no sangue!


                                                                    

Esta é a cantiga de Alfama, cantada e ouvida desde muito antes de haver Carminho (lembro-me de um beco onde se cantava o fado e em que, ao encerrar da noite, a cozinheira saltava lá de dentro, pegava no pequeno cão ao colo e desatava, acompanhada pelas guitarras,  a cantar e dançar  - alfama não envelhece ....). Mas a voz de Carminho encarna como ninguém o espírito destes fados ...


                 Para ouvir e bailar                                               

Marcha de Alfama

Alfama não envelhece                                                          
E hoje parece
Mais nova ainda
Iluminou as janelas
Reparem nelas
Como está linda.
Vestiu a blusa clarinha
Que a da vizinha
É mais modesta
E pôs a saia garrida
Que só é vestida
Em dias de festa

Becos escadinha ruas estreitinhas
Onde em cada esquina há uma bailarico
Trovas p'las vielas e em todas elas
Perfume de manjerico
Risos gargalhadas, fados desgarradas,
Hoje em Alfama é um demónio
E em cada canto um suave encanto
De um trono de Santo António.

Já se não ouvem cantigas
E as raparigas
De olhos cansados
Ainda aproveitam o ensejo
De mais um beijo
Dos namorados
Já se ouvem sinos tocando
Galos cantando
Á desgarrada
E mesmo assim dona Alfama
Só volta p'rá cama
Quando é madrugada.

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