Pelos anos finais de 1930 e alguns de 1940*, aparecia em Porto da Lage uma senhora, de quem não se sabia a idade mas que não aparentava ser idosa. Vinha por períodos curtos com uma pequena trouxa à cabeça, de aspecto andrajoso e refugiava-se em qualquer recanto que lhe parecesse mais abrigado. De noite, acendia uma pequena fogueira com pequenos garavetos para se acompanhar e aquecer. Ali estava sentada, espevitando a pequena fogueira, balbuciando palavras imperceptíveis. Durante o dia mantinha-se no mesmo local, na mesma posição, a cozinhar, não se sabia o quê, em pequenos recipientes recolhidos de algum lado.
A boa gente de Porto da Lage conhecia-a por "velha do chá", baptismo que terá sido sugerido pelo chás variados que ela preparava e bebia.
A pobre senhora não importunava ninguém a esmolar. Quando se socorria de um auxílio, era sempre como um empréstimo; era um ovo, uma colher de açúcar, uma chávena de arroz. Quando se dirigia às pessoas para contrair empréstimo, usava de palavras e tom de voz que acreditassem o favor. Se não era atendida no seu pedido, que acontecia com frequência, lastimava-se com palavras de resignação.
Nestas tristes condições, esta pobre senhora por aqui viveu, vagabundando, durante alguns anos. Desconhecia-se a sua origem e a identidade. Não terá sido uma vagabunda qualquer. A sua fisionomia ainda delicada, comportamento e modo de se expressar, denunciavam alguma educação cuidada.
Nos anos 60, quando eu vivia na Casa do Prado, ela refugiava-se no inverno junto à nossa casa pois aproveitava o calor dos tanques de destilado da Fábrica. Lembro-me que a minha mãe, pela janela da cozinha lhe dava alguma coisa, mas só aceitava muito pouco!
ResponderEliminarNo meu imaginário julgava que a velha do Chá fosse uma ex-professora primária carpindo um desgosto amoroso. Era triste e falava sozinha, em completo contraste com o Pobre Alegre que aparecia sempre a assobiar. O meu Pai encarregava-o de varrer ou regar a estrada principal quando esta era ainda de macadame, isto é antes de ser calçada e muito antes do alcatrão.
ResponderEliminarApós a tarefa terminada, tinha direito a um banho, roupa lavada e refeição. Havia uma banheira enorme que se enchia de água quente da Fábrica de Álcool. O Pobre Alegre temia doenças pois na sua experiencia, contava com vários casos em que conhecidos tinham adoecido no hospital após o banho obrigatório. Mas enfim poder vestir roupa lavada e uma refeição quente, valia bem o risco.
Nunca veio à fala com a Velha do Chá e assim se perdeu um casamento que daria brado.