Si hortum in biblioteca habes deerit nihil

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19 de fevereiro de 2016

O Piropo e o Comandante de Infantaria 11




Jornal A Verdade 7.09.1879

Pois, se calhar o sr. Comandante de Infantaria 11 não tomou as providências necessárias,ou se tomou não chegaram, ou então o senhor não chegava para as encomendas que eram muitas e duraram muitos anos ou, prontos, se calhar o senhor morreu ou assim,e por isso foi dada uma nova redacção ao artigo 170.º do Código Penal.
A sério, a geração de mulheres que agora mais se indigna, com aquilo a que chama piropo, mostrando-se agastadas ao ponto de cair no ridículo (e é fácil meninas, eles andem aí, para nos respeitarem no mundo deles temos sempre que valer MUIIIITO mais), pois dizia eu, essas mulheres desconhecem o que já lá vai!!!
Milhares de filhas e netas das raparigas da notícia de 1879 foram obrigadas a continuar a ouvir as bestialidades dos insultos saídos das bocas dos descendentes dos desgraçados soldados de então. Chamávamos-lhes "feijões verdes", à chusma  de soldados que,como os seus avós,aproveitavam o intervalo da suas preparações para a guerra, para se pespegarem lado a lado, em filas imensas, na ponte e nas grades à beira rio, e fazerem-se ouvir pelas miúdas que passavam sem adultos (no fundo eram umas crianças, o medo que eles, todos eles, tinham de outras calças ou de uma mãe anafada que lhes arregalasse os olhos!). Mas o pior, tanto como me dizem as minhas memórias de adolescente numa terra de província,  nem era "a tropa", submetida ao poder disciplinar e receosa de queixas. Não contando com os "trolhas", os mestres de sempre nesta arte das "chufas", havia a tropa fandanga da hora de almoço, os estudantes internos do colégio, os mais velhos que tinham ordem para sair e os alunos da escola industrial. O jeito de ladear as ruas era igual ao dos outros, mas sobrava nestes o atrevimento que a boçalidade e a policia militar impedia nos primeiros. Não sei se haveria grande diferença entre o comportamento destes "estudantes" de 1960/70 e o dos soldados de cem anos antes. O que não havia, de certeza, era um comandante de infantaria que os pusesse na ordem!
Felizmente, hoje tudo se modificou, apesar das meninas, e muito bem, ainda quererem mais. Quarenta anos chegaram para alterar hábitos de centenas! 
Continua a espantar-me a  forma extraordinária como este país se transformou! 
Mas nem tudo era mau e, quando a chusma se desligava, isto é, quando deixava de o ser e o "macho lusitano" não tinha outro ao lado para o apoiar nos dislates, as relações entre os sexos podiam até ser como a natureza manda, a sedução imperar e aí, com autorização ou sem ela , era bem-vindo o piropo quando do estilo deste aqui abaixo (MFM) 




10 de fevereiro de 2016

Quarta - Feira de Cinzas




Padre António Vieira

Duas coisas prega hoje a Igreja a todos os mortais, ambas grandes, ambas tristes, ambas temerosas, ambas certas. Mas uma de tal maneira certa e evidente, que não é necessário entendimento para crer; outra de tal maneira certa e dificultosa, que nenhum entendimento basta para a alcançar. Uma é presente, outra futura, mas a futura vêem-na os olhos, a presente não a alcança o entendimento. E que duas coisas enigmáticas são estas? Pulvis es, tu in pulverem reverteris: Sois pó, e em pó vos haveis de converter. Sois pó, é a presente; em pó vos haveis de converter, é a futura. 
...
........Comecemos de hoje em diante a viver como quereremos ter vivido na hora da morte. Vive assim como quiseras ter vivido quando morras. Oh! que consolação tão grande será então a nossa, se o fizermos assim! E pelo contrário, que esconsolação tão irremediável e tão desesperada, se nos deixarmos levar da corrente, quando nos acharmos onde ela nos leva! É possível que me condenei por minha culpa e por minha vontade, e conhecendo muito bem o que agora experimento sem nenhum remédio? É possível que por uma cegueira de que me não quis apartar, por um apetite que passou em um momento, hei de arder no inferno enquanto Deus for Deus? Cuidemos nisto, cristãos, cuidemos nisto. Em que cuidamos, e em que não cuidamos? Homens mortais, homens imortais, se todos os dias podemos morrer, se cada dia nos imos chegando mais à morte, e ela a nós, não se acabe com este dia a memória da morte. Resolução, resolução uma vez, que sem resolução nada se faz. E para que esta resolução dure e não seja como outras, tomemos cada dia uma hora em que cuidemos bem naquela hora. De vinte e quatro horas que tem o dia, por que se não dará uma hora à triste alma?
Esta é a melhor devoção e mais útil penitência, e mais agradável a Deus, que podeis fazer nesta quaresma. Tomar uma hora cada dia, em que só por só com Deus e connosco cuidemos na nossa morte e na nossa vida. E porque espero da vossa piedade e do vosso juízo que aceitareis este bom conselho, quero acabar deixando-vos quatro pontos de consideração para os quatro quartos desta hora. Primeiro: quanto tenho vivido? Segundo: como vivi? Terceiro: quanto posso viver? Quarto: como é bem que viva? Torno a dizer para que vos fique na memória: Quanto tenho vivido? Como vivi? Quanto posso viver? Como é bem que viva? Memento hom