Si hortum in biblioteca habes deerit nihil

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29 de março de 2016

Ilídio Mota Teixeira (1930-2016)


Eu tenho a fantasia de imaginar os homens como as árvores e por isso acreditar que a inteireza e a verticalidade dependem da estrutura do tronco, sim, mas que este, por si, rebenta com a ajuda do carácter das raízes. Tenho assim a tendência para arrumar as gentes (ia a dizer classificar mas pode confundir-se com ordenar e não é essa a minha intenção) de acordo com a importância que dá às origens. Há quem não lhes ligue nenhuma, quem viva tão ávido de “folhas, flores e frutos” que nem chega a ter raízes superficiais, está tão ao sabor do vento que corre o risco não de viver desenraizado mas desenterrado. Também existe o oposto, quem só viva à custa e pelas raízes, mas esses são grandes tubérculos, batatonas imensas cheias de vaidade, condenadas a vaguear sem a claridade que presenteia as árvores desta vida. E há outros, que vivem fazendo gosto em carregar consigo o berço, seja ele de que matéria for tecido, e transmiti-lo, à família e até a outros, sem que nada a isso os obrigue, só porque sim, porque são árvores altas e frondosas e a sua sombra todos acolhe. É o caso de Ilídio. Ele teve a generosidade de partilhar o que a sua memória trouxe de menino mais o que outros antes dele lhe contaram, e que a sua sensibilidade e inteligência souberam reproduzir. Tive a sorte de beneficiar dessa nobreza de alma.  A minha eterna gratidão. Graças a ele conheci alguma história e reflexões sobre a história de Porto da Lage, aquilo a que chamou lembranças e conjecturas a "pequena história" desta localidade na primeira metade do sec. XX, os seus tipos   trágicos e cómicos que mais do que uma geração conheceu, os dramas  locais e os  grandes acontecimentos, os pontos de encontro diversão, com o grémio à cabeça, e a grande marca da terra, a família,  as características especiais  dos tios , de primos e de primas. De tudo nos falou Ilídio Mota Teixeira, nos posts publicados com a colaboração de sua filha  no ano de 2013, com graça, talento e um  amor visível pela terra que o viu nascer. Guarda desta forma, este blog, as marcas de alguém que passou por nós cumprindo a missão de perseverar e transmitir heranças. Saibamos nós honrar a sua confiança legando-as a outros. (MFM)



Ilídio Mota Teixeira com a idade de 22 anos na colina da Ermida de Sta. Margarida

Ilídio Mota Teixeira nasceu em Porto da Lage em 8 de Novembro de 1930, sexto e penúltimo filho do casal  Luís Pereira Teixeira e Ana Rosa Mota. A irmã Doce recorda-o como uma criança alegre, grande caçador de grilos que trazia para casa em quantidades apreciáveis, dentro do boné. Era também um cavaleiro apaixonado, tendo chegado a ir até Ferreira do Zêzere montado numa égua propriedade da sua casa. Depois da  primária em Porto da Lage, na escola sua vizinha de rua, fez o Liceu na cidade do Porto, localidade onde exerceu toda a sua actividade profissional na empresa familiar da qual era sócio, onde viveu o resto da sua vida, tendo-se apenas afastado para cumprir o serviço militar em Tavira e Tomar. Faleceu, igualmente no Porto, no passado dia 23 de Março.Deixa duas filhas e uma neta.

Nota: Fotografia e dados biográficos fornecidos pela irmã, Dulcinda Mota Teixeira.

4 comentários:

  1. Soube hoje aqui da morte do Ilídio Mota Teixeira. Não cheguei a conhecê-lo pessoalmente, mas não perdi uma única história sua. Acabaram; a Luísa, “senhora sua filha”, a quem apresento as minhas condolências, bem nos dizia que «É só darem o "mote" e aí vai ele...! Depois não digam que não avisei!». Avisou, avisou, mas não aproveitámos. Será que não haverá mais umas histórias? A Filomena fez uma bela evocação do Ilídio e recordou a sua "pequena história" desta localidade na primeira metade do sec. XX, dos seus tipos trágicos e cómicos. Escolhi esta última. «Diariamente o Xico Pirum, guiava uma junta de vacas atreladas a uma galera, entre o cabeço da quinta e o forno de tijolo em Porto da Lage. Partia das instalações do forno de tijolo, atravessava a povoação, a ponte sobre a ribeira, seguia pela frente da escola, do lagar e da casa do lagar. Na curva do moinho deixava a estrada, subia a ladeira da quinta até ao topo onde existira uma pequena casa que fora habitação do rendeiro e depois proprietário da Quinta da Belida. Depois era fazer percurso inverso». Cá está a história de Porto da Lage em percurso inverso. No fim, o senhor Xico Pirum trabalhou na minha casa até poder. Aparece ao lado do meu pai e tios, na fotografia junto da estação que este blog Porto da Lage já publicou. Tios, primos e primas que o Ilídio retratou com “as suas características especiais”. “Lembranças e conjecturas”.
    Obrigado
    Óscar Mota

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    1. "A história de Porto da Lage em percurso inverso"! Muito boa leitura desta bela história do Ilídio e que eu nunca tinha feito assim. Confesso que fiquei literalmente presa à triste história do Xico Pirum (reparo agora que, com tanto link, acabei por ironicamente o "ligar" ao "cómico") e me escapou a imagem que o Óscar viu e que, conscientemente (?), o Ilídio nos contou. Mas já agora, não querendo largar o registo neo-realista com que li a história e continuando a fazer uso do que o Óscar nos diz, confesso também que não pude deixar de ficar feliz (eu gosto de finais felizes) por saber que o sr. Xico Pirum há de ter tido, depois de todos os “marqueses de Pombal” que se lhe atravessaram na vida uma velhice tranquila. É o último da direita na fotografia ( http://portodalage.blogspot.pt/2013/04/recordacoes-da-nossa-aldeia.html)? (MFM)

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  2. Belo epitáfio do Ilídio.
    As felizes imagens botânicas fariam a delícia dele e do tio João dos Olivais, avô da autora.
    Com ele vai-se o último daquela ínclita geração de rapazes de PL. Agora estamos nós à bica- o Zeca Brás, Luís Sousa, o Vital, o Artur Simões e eu - que o Virgílio se nos antecipou como sempre.
    Esta foto do Ilídio em 1952 poderia figurar na próxima temporada da série inglesa Downton Abbey; explica que ele tivesse escolhido viver no Porto, a mais britânica das cidades portuguesas.

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  3. Foi o melhor avô do mundo.
    Um beijinho grande
    (Ana Mota)

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